quarta-feira, 30 de março de 2011

Sabem uma coisa? Sinto-me triste e envergonhada

Faço parte do grupo dos que se lembram do antes do 25 de Abril. Era criança em 1974, mas tenho memórias. Lembro-me de ouvir anunciar a Revolução na rádio, pela manhã, com avisos para que as pessoas não saissem de casa, para "evitar um derramamento de sangue", exactamente assim. Lembro-me do medo que senti pelos riscos que o meu pai e alguns dos meus irmãos poderiam estar a correr (já tinham ido para o trabalho, não tinham ouvido notícias). Nesse dia não tive aulas e foi uma festa...um tanto assustadora, mas uma festa,  já que via alguns adultos a gritar "Viva, viva, somos livres". Naquela altura não compreendia que liberdade ganháramos mas, com a curiosidade dos meus 8 anos em diante misturada aos livros que os meus irmãos carregaram para casa e que as bibliotecas facultaram, fui percebendo.

Lembro-me, também, da crise do início dos anos 80 e das consequências devastadoras que teve na economia familiar. Foi preciso mudar de vida.

Tive a sorte de ter pais que, na sua humildade e escassa ambição, sempre revelaram enormes capacidades de elevar o essencial e desprezar o acessório. Ultrapassaram esta, como todas as crises por que passaram ao longo de mais de oito décadas de existência, fazendo crescer e prosperar a sua enorme familia.

Já com o canudo nas mãos, em 1990 assumi a minha total independência económica que, até à data não perdi e que, lá no fundo, achava que não voltaria a perder.

Pensava, ingenuamente, que vivia numa sociedade em que haveria sempre trabalho para quem quisesse trabalhar e vê-se bem que não. Pensava que quem nos governava, apesar dos muitos erros de governação que me saltavam à vista, sabia minimamente o que andava a fazer, mas não era verdade.

Cedemos tudo. Não há agricultura, nem pescas, nem indústria têxtil, nem..., nem.... A troco de escudos, mais tarde de euros, que serviram muitos interesse particulares, em lugar de serem deveras aplicados no desenvolvimento do país, deram tudo e teriam dado o nosso sol se não nos estivesse preso ao céu, em troca de mais dinheiro que engordaria alguns.

E agora? O que é que temos? Muitas auto-estradas, dívidas, a expectativa de não comer amanhã e um povo enganado e triste.

Todos os dias perdemos dignidade e o futuro deixou de ser incerto: temos a certeza de que será muito mau.

Sinto-me envergonhada face aos meus pais e aos meus filhos. Perante os primeiros porque acreditaram em mim e na minha capacidade para ajudar a mudar o meu país para melhor, o que não aconteceu,  e, quanto aos segundos, porque os deixei acreditar, tempo demais, num mundo de faz de conta e os deixarei num mundo em nada melhor do que o que me entregaram.

Caí num abismo. Tenho consciência que nada mais me resta do que deitar mãos à obra. Não posso continuar a deixar o meu destino nas mãos dos outros, que se têm revelado tão incompetentes e tão escravos de interesses que cumpre desproteger.

Recorrerei aos valores humanistas que aprendi em casa, no Governo dos meus pais:  a liberdade; a verdade; a honestidade; o respeito pelos outros, sobretudo pelos mais frágeis; o dever de ajudar os que estão doentes, sem trabalho, que têm menos aptidões; o valor do trabalho para o crescimento e auto-determinação; o valor do amor, da amizade e da solidariedade.

Acredito que face ao que temos vivido nos últimos tempos, enquanto sociedade, haja muita gente que, tal como eu, se sente enganada, revoltada, descrente e que, tal como eu, não está disposta a acreditar em politiqueiros.

Precisam-se ESTADISTAS!

terça-feira, 29 de março de 2011

Pinceladas da minha cidade

Quando o sol brilha no Terreiro do Paço e os pombalinos edíficios amarelos contrastam com o azulzinho do céu, não há no mundo mais linda cidade do que Lisboa. Esta praça, eternamente visitada pelo Tejo que passa, às vezes lento, doutras apressado, em direção ao mar, iguala ou ultrapassa as mais lindas praças de todo o mundo (qual Praça de S. Marcos, qual carapuça!- diz a Fernanda).

Vinha agora do almoço e vi-a assim. Parei para a apreciar. Olhei a estátua equestre de D.José I, cuja autoria é atribuída ao maior escultor português do Século XVIII, Machado de Castro, mas que o meu falecido professor de História do Direito, Ruy de Albuquerque, nos ensinou que aquele não é D.José I, embora vise representá-lo, já que a estátua terá sida adquirida a preço de saldo no México, onde estava sem destino(?)...

 Virei-me de costas para o Tejo e olhei a Rua Augusta sob o seu Arco Triunfal, rodei a cabeça à direita e admirei o Castelo de S. Jorge, lá no alto, com o seu arvoredo verde, dentro dos muros e depois, olhando a Sul, lá estava ele, o imenso Tejo. Quantas cidades se podem gabar de assim ter um rio lindo? O que eu corri em Viena para encontrar o Danúbio e depois de canais de água escura e decepcionantes encontrei, vários quilómetros depois da cidade, o Grande Danúbio, como lhe chamam... ai, tão estreitinho e contido em margens artificiais... e, afinal, não é azul. Aqui, em Lisboa, o meu Tejo é largo, lindo e selvagem.

Acabado o intervalo dirigi-me às arcadas onde encontro a porta de entrada do local onde trabalham os meus neurónios.

Nas arcadas já não habitam aqueles residentes, que não tendo outro tecto, as transformavam, ainda há pouco, num condominio nauseabundo. Sempre que eu chegava, de manhã, enquanto alguns acabavam de dormir (ou persistiam submersos no seu sono infinito), cobertos ou não, na sua divisão de cartão, já outros faziam as suas arrumações matinais, pondo a salvo os seus pertences que os protegiam do esfriar da noite.

Durante o tempo em que ali habitaram, assisti aos casamentos que se fizeram e desfizeram; a festas de copos de vinho tinto assentes num contentor de lixo verde que, num passo de mágica, transformavam em mesa; a discussões; a conversas banais.

O que me encantava era o elemento masculino de um par, ali formado, que, enquanto a companheira dormia, com a ressaca, ia arrumando os bens do casal e varrendo aquele que considerava o seu domínio, num arremedo de vida normal (seja lá isso o que for). A seguir, sentava-se a ler o jornal.

Foram todos expulsos, eram o escândalo de tão nobre praça. Não que a praça se escandalize, já assistiu aos nus que se banhavam junto ao Cais das Colunas, em pleno século XVIII...

Mas escandalizávamo-nos nós, para esconder a vergonha que sentíamos por ali os ver, assim desprotegidos, fazendo tão pouco por eles... (preocupa-me não saber onde andarão...)

segunda-feira, 28 de março de 2011

Trama, urdidura e novelos...

Ocupo-me a viver a vida, tecendo-a no meu tear.

A urdidura está pronta há muito, com fios fortes e tensos.

A trama, essa, vai-se fazendo. Passam na cala  linhas ásperas e fios de seda. Fortes uns, frágeis outros.

E todos, mesmo todos, os fios que compõe o meu tecido, me chegam em novelos enovelados, embaraçados, emaranhados, enguiçados, onde busco, às vezes aflita, a única ponta que têm para os transformar, com dor, em fios para a minha trama.

E a trama vai-se expandindo...

domingo, 27 de março de 2011

Fada roubada trancas à porta

Último fim de semana de Março. Já estamos na Primavera, embora não se note nada, já que está de chuva...
mas um fim de semana, sempre é um fim de semana, mesmo chuvoso.

De todos os fins de semanas do ano, este é o de que menos gosto. É que, apanham uma fada a dormir e, à traição, zás roubam-lhe uma hora. Não me conformo, pronto. Se me querem roubar a hora, o que acho mal, ao menos façam-no quando estou acordada e, de preferência, a trabalhar. Uma coisa assim do estilo: serem 17h e passarem a ser 18h, de um qualquer dia útil. Agora assim?? estar uma pessoa a gozar o seu merecido descanso e, sorrateiramente, o relógio saltar logo 60 preciosos minutos de sossego? Desculpem mas não se faz!!!! Protesto!!!

domingo, 13 de março de 2011

Apontamentos da ilha de Santiago


Sábado, 10 de Abril de 2010, 9.02h

O dia, como sempre desde que cá estou, está luminoso, o mar azul e calmo, sentindo-se uma leve brisa morna.

No hotel a azáfama é grande, já tomei o pequeno-almoço acarinhada pelos empregados do restaurante que me vão tecendo elogios aos, segundo eles, visíveis resultados do meu empenho na dieta, mas que, segundo me parece, pouco passam da leitura generosa das lentes destes observadores. Provavelmente querem, além de me apoiar, colher o meu agradecimento, o que procuro fazer, por ele. Apoiam-me, concretamente, na forma pronta como me entregam uma maçã, ainda que tal peça de fruta não faça parte do cardápio, para levar para o trabalho e comer ao meio da manhã, porque, dizem no seu dulcíssimo português acrioulado: “à sinhora tem di comerr, porque à sinhora num é gorrda,  é sexi “, ou: “ eu gostarria di engorrdar e ser como a sinhóra, e à sinhóra anda a fazer rêgime, más issu num si discute”. Enfim, opiniões…

O trabalho, felizmente, até agora, tem corrido muito bem. Todas as noites procuro preparar bem a sessão do dia seguinte. Tenho um grupo de formandos bastante homogéneo, embora haja algumas assimetrias a nível académico, sendo que, na sua maioria, são licenciados, em cursos vários, preponderando o Direito e a Economia. 
Consegui “agarrar” bem o grupo desde o início, com recurso à utilização de técnicas pedagógicas, nomeadamente modificando a disposição dos móveis da sala de modo a colocá-los em posição susceptível de gerar maior interacção entre eles e, sobretudo, entre mim e o grupo. É que, assim, com a disposição das secretárias em U, posso acercar-me de cada um em particular quando entendo, para comunicar olhos nos olhos, procurando passar conhecimento, indagando ou, quando necessário, intimidar eventuais distraídos. Isto, associado ao meu vozeirão, que utilizo em diversos tons e ritmos, consoante os objectivos que viso, somado a alguns sorrisos, estorietas e algum (pouco, entenda-se) conteúdo científico, tem dado bons resultados (boss Teresa o aparte é puro humor e falsa modéstia).

Ontem à noite, depois da excelente aula de natação (seguida de um bom relex na piscina), fiz 30 minutos de passadeira no ginásio. Ali o esforço do exercício tolera-se com alguma facilidade, porque o Mike, o meu “personal trainer”, não me larga o pé, com o seu discurso surreal, que não sei se se dirige a mim ou a ele próprio, através do espelho, que ocupa, na íntegra, uma das enormes paredes do espaço, e que ele não pára de olhar, dos mais diversos ângulos, enquanto relata escabrosos eventos, como o da cooperante portuguesa, professora de inglês numa qualquer universidade local, que era “bonita e boua, mesmo bonita e boua, de cabelos compridos, mas a dáma fez tanto exerrcício que ficou sem nada, a pesar 32Kg”, enquanto vai fazendo gestos para ilustrar o que prelecta…Um cromo! 

Mais tarde, fui assistir, no centro da cidade, o Platô, a um dos concertos do “Festival de Jazz Kriolo”, que apreciei, mantendo ainda no pulso a pulseira de plástico, que um segurança de 2m me colocou, para me garantir o direito de regressar logo à noite, pois o bilhete que comprei é válido durante os 2 dias do festival. 

Já contratei os serviços de um taxista para amanhã o ter por minha conta, todo o dia, com o fim de conhecer a ilha, indicando-lhe os pontos aos quais pretendo ir, com base numa selecção que fiz num mapa do local. Penso ir, designadamente, à Cidade Velha, a cerca de 7 Km (antiga capital de Cabo Verde e primeira cidade edificada na África Subsahariana- Séc. XV); à magnífica praia e ao campo de concentração do Tarrafal (mas não se iludam porque não tenciono lá ficar), que fica a cerca de 70Km daqui. O percurso até lá será feito pelo interior (onde pararemos nos picos montanhosos de onde será possível, se estiver céu limpo, avistar outras ilhas) e o regresso far-se-á acompanhando a linha da costa. Veremos.

Vou agora à minha aula de natação, pela qual estou ansiosa já que nesta matéria sim, os meus progressos são notórios, além de que o momento é muito prazenteiro pois o professor é excelente e as minhas colegas (a maioria com nomes indizíveis, salvo o de uma que acho magnífico -“Deusa”) são, tal como eu, muito animadas pelo que, além de se treinar “ à séria”, se faz sempre uma enorme galhofa.
Agora vou concluir à moda habitual dos pareceres de natureza jurídica, dos quais, diga-se em abono da verdade, ainda não tive “sôdade”:

“Face a todo o exposto, somos a concluir que a experiência vivenciada pela signatária na Cidade da Praia - Ilha de São Vicente – Cabo Verde, se tem revelado positiva e, por isso, digna de ser repetida”.

Desculpem se vos impacientei com o meu longo discurso, ilustrativo de uma característica que Alguém me imputa: “Para ti, o que não dizes não existe”.

Bjs para todos e muito obrigada pelo amor e amizade (conforme aplicável).
“Sôdade bô”
Ana                                                                

P.S.: Pasmem! Neste fim do mundo africano veio uma europeia aprender (entre outras coisas, como um pouco de crioulo, que ando a treinar) uma das virtudes das novas tecnologias – a comunicação por video conferência (será assim que se diz?). Este meu “handicap” tecnológico é muito limitador...




terça-feira, 8 de março de 2011

Sou mulher, muito prazer...

Todos os dias é dia Internacional de qualquer coisa e, nesse quadro, convencionou-se celebrar o dia 8 de Março, como o Dia Internacional da Mulher.

Neste dia sairam à rua, em manifestação percursora da revolução de Outubro de 1917, mulheres russas gritando por paz e pão, contra a entrada do seu país na I Guerra Mundial. Mas nele também se celebram os movimentos sufragistas americanos do início do Século XX, bem como todas as demais conquistas sociais, políticas e económicas, alcançadas ao longo de todo o século passado, pelas mulheres.

Tive a sorte de ter nascido na segunda metade do século XX, no mundo Ocidental (apesar do negrume do meu país, à época), no seio de uma familia em que homem e mulher eram iguais, em respeito e dignidade.

Não posso afirmar, sem faltar à verdade, que nunca fui alvo de discriminação, em função do género a que pertenço - claro que sim. Refira-se, por exemplo, que sempre impendeu sobre mim a maior fatia da responsabilidade pela gestão e execução das tarefas domésticas, ou, ainda, que cresci com o espartilho de uma sociedade assente nos princípios judaico-cristãos, no que toca aos comportamentos socio-sexuais admitidos às mulheres, com a permanente espada da censura.

Admito que nunca ousei desafiar, expressamente, tais normas sociais, habituei-me a lidar com esses problemas recorrendo à ardilosa inteligência feminina, contornando-os subtilmente. Estou, até, convencida que muito do alegado sexto sentido feminino resulta da evolução do nosso cérebro face às sobreexigências que a natureza e a sociedade nos impõe, nalgumas matérias.

Tendo beneficiado da possibilidade de aceder à educaçação em condições de igualdade, relativamente aos seres do género masculino, de ter acesso à cultura, e de, por enquanto, ser remunerada pelo meu trabalho em condições de igualdade com os meus colegas homens que têm a mesma função, tenho de reconhecer que ainda se não verifica, na nossa sociedade, completa igualdade de género pois, não é por acaso que, as lideranças socio-políticas continuam a pertencer maioritariamente a homens.

Mesmo alarmante, é que em muitas sociedades além da discriminação se verifique uma enorme violência contra as mulheres...

Pela minha experiência, reconheço que sou também objecto de discriminação positiva. Tenho, por ser mulher, a liberdade de expressar livremente as minhas emoções, todas, sem excepção, desde as lágrimas ao riso estridente. Sinto-me, pela minha condição feminina, frequentemente, protegida pelos homens, podendo, se quiser, revelar-me frágil, sem que tal atitude seja mal vista. Quantas vezes se aceita, com a mesma naturalidade, a fragilidade masculina?

Pois é, sou mulher, gosto de o ser e, pessoalmente, não preciso de nenhum dia comemorativo do meu género.

Do que acho que precisamos, todos, é de nos olharmos e tratarmos, uns aos outros, como humanos.

Essência




48 h em estado de letargia. Parece que chegou ao fim. Regressei a mim.
Não sei, porém, ainda, como me encontro.
Quem irei, desta vez, descobrir? 
A rigorosa e implacável? Ou a indulgente e desculpabilizante?
A agitada ou a serena? A animal ou a melosa?
A que chora, ou, antes, a que ri, canta e dança?
Aparecerão todas. São todas a minha essência.

Carcavelos, 3 de Julho de 2010, 23h58


segunda-feira, 7 de março de 2011

Interior III - Há dois dias voltei à casa!!!!!

Depois de deixar a casa, rumo ao Sul, em 1984, voltei lá 5 anos depois, em visita. Encontrei, naquela altura, a dona da casa levando ao colo o seu destino - cuidando do senhor, então acamado ,já sem poder falar  (tinha sofrido um AVC muito incapacitante).

Desde então, 1989, não mais lá voltei. Ocupei-me com a minha vida aventurosa, cheia de acontecimentos tempestuosos, alguns arrasadores, quase mortais.

Ocasionalmente, ocorria-me que devia voltar à casa, para saber do casal. Na minha cabeça estava claro que o senhor partira, com a idade e o estado em que o tinha visto, nada mais se esperava. Mas, e ela? Sem filhos...estaria viva, mas sózinha? Pairava em mim um difuso sentimento de culpa por não ter lá voltado.

Claro que a culpa se vai mascarando, há inúmeras justificações para o abandono a que votamos os outros: a vida cheia que temos; a eterna falta de tempo: o trabalho, a familia, as dores, as doenças; neste caso, também, a distância... Passo, por vezes, ao largo da cidade, mas sempre com destino marcado e, geralmente, acompanhada por pessoas que não veriam interesse na busca da casa e dos seus habitantes...

Há dois dias apanhei-me sózinha naquela cidade, com algumas horas livres (adoro quando isto me acontece), que resolvi usar para procurar a casa.

Estacionei o meu carro e deambulei pela cidade, observando-a (tirei algumas fotos). Lembrava-me bem da rua em que a casa ficava, e para lá me dirigi, mas tinha dúvidas quanto ao número da porta.

A avenida pareceu-me mais estreita do que me recordava (também está com obras na rua, o que altera a percepção do espaço...) e lá a percorri , calmamente. Olhei com atenção as casas e as lojas, apercebi-me de mudanças e de permanências. Tomei um chá e comi uma torrada na pastelaria a que, ocasionalmente, estava autorizada a ir tomar um café, quase há 30 anos, com o limite máximo estabelecido das 21h, para regerssar à casa. A pastelaria foi modernizada, mas não é uma sombra do que fora. Naquela altura estava sempre cheia de pessoas e de fumo de tabaco, agora estava vazia e asséptica...sem alma.

Um quarteirão à frente estava O prédio. Custou-me reconhecê-lo, está pintado de novo, muito bonito, mas o número da porta apagado, e tem uma nova loja chique no andar térreo. Identifiquei-o pelo terraço-terraço a que acediamos, à sucapa, saltando a janela do nosso quarto, para ver os transeuntes e de onde uma das meninas, atrevida, costumava dizer aos "magalas" que passavam: "adoro feijão verde !...", baixando-nos todas de seguida, de modo a ficar escondidas pelo muro, para eles não detectarem a origem e autora do piropo... Maravilhosa adolescência...

Quando me aproximei da porta fechada do prédio, agora de alumínio verde (antes era de madeira e costumava estar aberta), receei não encontrar quem procurava, achei que prédio tão renovado teria novos inquilinos...mas vi, com enorme satisfação, as campainhas e, uma delas, identificada com o nome da senhora que procurava, o que me fez pensar de imediato: "que bom, está viva!". Premi o botão com força e, não mais de um minuto depois, a dona da casa assomou à janela, perguntando:"Quem é?". Olhei-a com grande felicidade - era ela e estava igual!!! Afastei-me da porta da entrada, pondo-me no meio do passeio, para que me visse bem, e  respondi: "Olá D. A, sabe quem eu sou?" , ela sorriu, com manifesto agrado, dizendo: " Menina Ana ?!?!?".

Subi a escada que tão bem conhecia (no interior nada fora renovado, o senhorio só se preocupou com a fachada...) enquanto as fotografava, lembrei-me de muitas coisas (naquele vão de escada troquei, naquele passado, alguns beijos apaixonados, enquanto treinava o amor com um namorico nativo...).

A dona da casa recebeu-me com calor e afeição, abraçámo-nos com força. Gostei de rever todas as divisões da casa. O meu quarto... Quis saber das minhas amigas da altura, mas a senhora não sabe os destinos de muitas delas.

Ali ficámos as duas sentadas no sofá da sala, assistidas pela cadela que tem por companhia e que, insistentemente, me pedia os afagos que lhe não neguei. Falámos das nossas vidas actuais,  recordámos o passado comum e partilhámos aquele que vivemos em separado.

Achei-a triste e sózinha. Procurei dar-lhe ânimo, contagiá-la com optimismo, através das palavras, de sorrisos, de abraços... Fiz algumas graças e, com elas, pu-la a rir, dizendo: "Ai esta menina..."

Foi tão bom... mais um contibuto, para me limpar e encher a alma. :)

P.S. Trouxe o seu número de telefone, vou telefonar-lhe para a alentar...prometo que não me esqueço.

sexta-feira, 4 de março de 2011

Dormir? E os livros?...

A fada está ensonada, mas tem pena de ir dormir...

Gosto e preciso de dormir, mas tenho pena do tempo que "perco" a fazê-lo...é que a vida tem tantas coisas interessantes para fazer... E, à medida que o tempo passa, vou-me apercebendo de que já não vou ter tempo suficiente para fazer o que me falta.

Não tenho planos para a vida, nem ambições materiais ou outras, mas os livros? Como vou ler todos os livros, que me faltam devorar?

É verdade que já vivi mais experiências do que suspeitava poder viver, boas e más, de que me posso, pois, queixar? ... mas os livros, quando os vou devorar?

Vou folhear um bocadinho, até não poder mais ... tantos livros, meu Deus, tantos livros,  e tempo para os devorar?

terça-feira, 1 de março de 2011

Relações... quentinhas e boas

Tudo o que é precioso carece de preservação com cuidado e atenção.

As jóias, por mais duras que sejam, manuseiam-se com jeitinho e, delicadamente, conservam-se embrulhadas em algodão em rama. Desse modo, mesmo que não as usemos durante muito tempo, voltaremos a encontrá-las bem tratadas e esplendorosas.

Há que cuidar da mesma maneira as relações interpessoais valiosas. Quando se sintam em construção (que é permanente), devem ser manuseadas com delicadeza, tratadas com amabilidade, mesmo mimadas, e, depois, há que agasalhá-las bem em algodão em rama - puro, alvo, macio, fofo e quente. Só assim, nesse aconchego, conservam e fermentam a sua qualidade. Ficam tremendamente doces, algumas com um toque picante, mas sempres reconfortantes, proporcionando enorme felicidade aos que dela beneficiam.